Oficina CEER
 04-01-2013
À PROCURA DO MAIOR DESTRUIDOR DE BACTÉRIAS PATOGÉNICAS

São cada vez mais as bactérias "multirresistentes", capazes de contornar a mais de três classes de antibióticos, constituindo um "perigo" para a saúde pública. Situações semelhantes fazem com que determinadas doenças infeciosas não possam ser controladas, o que resulta na morte e morbilidade de milhares de pessoas. Este cenário poderá vir a alterar-se dentro de alguns meses com o desenvolvimento, por parte do Grupo de Biotecnologia de Bacteriófagos do Centro de Engenharia Biológica (CEB) da UMinho, de um super-fago capaz de combater estes micróbios. Prevê-se que a solução esteja pronta no final de 2013, tendo benefícios imediatos nos gastos associados ao setor da saúde: "Os custos anuais ligados à resistência aos antibióticos são de aproximadamente dois biliões de euros. Esta seria mais uma forma de reduzir os gastos com a saúde", revela a coordenadora do grupo Joana Azeredo.

O trabalho de investigação intitula-se "Terapias virais inovadoras por modificação genética de bacteriófagos" e está a ser desenvolvido em colaboração com um grupo de Biologia Sintética do MIT – Massachusetts Institute Technology, através das investigadoras Sanna Sillankorva e Priscila Pires. O objetivo é desenvolver produtos, baseados em bacteriófagos (ou fagos) ou proteínas produzidas por esses agentes antimicrobianos, capazes de matar bactérias patogénicas resistentes aos antibióticos. Estas novas terapias antimicrobianas poderão ser utilizadas no tratamento de infeções da pele, úlceras de pressão, feridas crónicas, amigdalites, otites, bem como infeções pulmonares, genitais, urinárias, gastrointestinais, através da administração local dos princípios ativos, entre outros. O super-fago será a primeira substância "quimérica" com capacidade para "matar mais rapidamente" e com uma ação mais alargada. Vale a pena recordar que o fago é um vírus que se encontra na natureza e infecta apenas as bactérias, contextualiza a docente, avançando que a solução estará pronta daqui a aproximadamente seis a nove meses. O fago, pequena partícula com 200 nanómetros, poderá ser incorporado em medicamentos.

O crescente interesse dos fagos como agentes terapêuticos deve-se fundamentalmente ao aparecimento de bactérias com múltiplas resistências aos antibióticos. "As doenças bacterianas que até há pouco tempo eram facilmente debeladas com antibióticos passaram a ser importantes ameaças à saúde humana", explica Joana Azeredo. Esta situação assume grandes proporções nas unidades de prestação de cuidados de saúde, onde são administradas elevadas quantidades de antibióticos. "Os agentes antimicrobianos, como os fagos e as endolisinas, apresentam maior capacidade para atuar contra estes micróbios e, assim, proteger mais eficientemente os doentes", acrescenta a professora do Departamento de Engenharia Biológica, que estuda esta questão há mais dez anos.

A investigação inclui várias etapas, sendo que a primeira passou pela caracterização genética dos fagos, que permitiu identificar os genes que codificam proteínas com ação antimicrobiana. Foram ainda desenvolvidas por Leon Kluskens e Franklin Nóbrega, também investigadores do CEB, técnicas inovadoras para manipular geneticamente os bacteriófagos e torná-los, deste modo, mais eficazes no combate bacteriológico. No laboratório do Grupo, já foram inclusive produzidas endolisinas, que estão a ser utilizadas em conjunto com fagos, no sentido de otimizar a sua ação antimicrobiana.

Aplicação de fagos na indústria alimentar.

Os produtos à base de bacteriófagos não serão uma exclusividade do setor da saúde, pois também poderão ser aplicados na indústria alimentar para a obtenção de produtos mais seguros. As investigadoras do grupo Elisabete Fernandes e Carla Carvalho, em parceria com o INL – Instituto Ibérico de Nanotecnologia, desenvolveram há pouco um interface de deteção de agentes patogénicos comuns nos produtos avícolas. A especialista Joana Azeredo salienta a importância de terapias antimicrobianas no setor agropecuário, onde o uso de antibióticos nos animais é muito restritivo. "Milhares de animais morrem de doenças bacterianas, o que representa uma perda significativa de dinheiro para os produtores", assevera.

Na produção avícola, por exemplo, a bactéria E. coli provoca infeções respiratórias graves que causam a morte das aves em pouco tempo. Um dos primeiros trabalhos realizados por este grupo de investigação assentou no desenvolvimento de um produto à base de fagos para controlar esta situação. A solução foi criada em colaboração com uma empresa nacional, no âmbito do doutoramento de Ana Oliveira, um projeto financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia.

Grupo de investigação em várias frentes.

O Grupo de Biotecnologia de Bacteriófagos também se juntou recentemente à Universidade de Leuven (Bélgica) para patentear uma nova tecnologia baseada no uso de endolisinas, cujo objetivo é destruir em poucos minutos bactérias indesejadas, como a E.coli, conhecida por provocar infeções do aparelho excretor, meningites e pneumonias. Esta ferramenta resultou dos trabalhos doutorais de Sílvio Santos e de Hugo Oliveira, ambos do CEB, sendo agora explorada por uma empresa estrangeira. “A tecnologia terá que ser validada, mas há grandes possibilidades que possa vir a ser utilizada nos hospitais”, confirma Joana Azeredo.

No âmbito do pós-doutoramento da Gabriela Trigo e em parceria com o Instituto de Investigação em Ciências da Vida e da Saúde, está a ser estudada ainda uma abordagem terapêutica para a “Úlcera de Buruli”, que é uma doença emergente em África e de difícil tratamento.

A história dos antibióticos... contada por uma cientista.

O primeiro antibiótico foi descoberto em 1928 por Flemming, que produziu uma substância chamada penicilina. Esta descoberta só despertou interesse científico com o eclodir da II Guerra Mundial, momento em que se multiplicaram os estudos sobre o assunto. O uso da penicilina e de outros antibióticos que entretanto foram descobertos ou sintetizados generalizou-se no mundo ocidental e começaram a ser utilizados de forma indiscriminada até aos dias de hoje. Relatórios da Organização Mundial de Saúde revelam que mais de 50 por cento dos antibióticos são prescritos de forma inadequada.

As bactérias têm grande capacidade de desenvolver resistência aos antibióticos e transmiti-la a outros organismos através de trocas genéticas. Daí terem surgido inúmeras bactérias capazes de resistir a mais de três classes de antibióticos diferentes. Este problema assume grandes proporções nas unidades de prestação de cuidados de saúde, onde o uso de antibióticos é intensivo, criando enormes pressões seletivas às populações microbianas existentes, o que origina o rápido desenvolvimento e disseminação de bactérias resistências. Este cenário verifica-se ainda na própria comunidade, que recorre indiscriminadamente a antibióticos, na produção animal e na utilização intensiva de agentes antimicrobianos na desinfeção de superfícies.

Quem é Joana Azeredo?

Joana Azeredo é doutorada em Engenharia Química e Biológica pela UMinho. É investigadora do CEB há mais de 10 anos, tendo assumindo a direção adjunta em 2010. A sua atividade de investigação centra-se no domínio da fisiologia de biofilmes microbianos e na aplicação biotecnológica de bacteriófagos. Durante o seu percurso científico estabeleceu várias parcerias científicas internacionais, nomeadamente com as universidades de Harvard e Auburn (ambas nos EUA), Leuven (Bélgica), Cardiff e Bristol (ambas no Reino Unido), Oulu (Finlândia) e ainda com o Leatherhead Food Research Institute (Reino Unido). Tem mais de 100 artigos em revistas científicas internacionais e dez capítulos de livros. E, no meio disso tudo, ainda consegue andar de bicicleta, à beira-mar, com a família…

Livro.
Gosto particularmente de romances históricos, o último que li foi o “Anjo Branco”, de José Rodrigues dos Santos.

Filme.
"Quem Quer Ser Bilionário?", de Danny Boyle, não só pelo argumento, mas sobretudo pela cor e música.

Música.
Música clássica, de preferência e em particular “Sergey Rachmaninov – Concerto No.2 para piano”.

Passatempos.
Andar de bicicleta, à beira-mar, com a família.

Viagens.
Brasil, em especial Amazónia.

Clube.
Portugal. Não aprecio futebol, mas ainda consigo ver os jogos da seleção.

Gastronomia.
Queijo, todos os tipos de queijo e toda a comida que contenha queijo, por exemplo a italiana.

Personalidade.
Aung San Suu Kyi, líder da Liga Nacional pela Democracia da Birmânia.

Sonho.
Trazer o mar para Braga.

UMinho.
Uma Universidade bem preparada para o futuro, com a qual me identifico e me orgulho de fazer parte.

Fonte: www.uminho.pt